
Movido por uma ordem da Associated Press, exigindo que seus críticos de cinema (e artes) não passem de 500 palavras em suas resenhas, Roger Ebert, um dos mais importantes articulistas de cinema dos EUA declarou a morte da crítica em seu blog.
Não é rancor de um jornalista ultrapassado. Antes de mais nada, não sou um devoto de Ebert. Ele tem seus momentos de Rubens Ewald Filho, mas sabe escrever e segue uma lógica de estudo e não de teorias maluquetes ("Adrien Brody ganhando um Oscar é ruim para o cinema, porque agora atores feios poderão ser protagonistas de grandes filmes"). Já conversei com ele em algumas ocasiões em Nova York e já me parecia cansado, mas nunca alheio a novidades.
O texto dele é coerente e mostra bem como anda o mercado jornalístico cinematográfico dos EUA. A Premiere, a única grande publicação de cinema, morreu por causa da baixa vendagem. Verdade que a revista pecava por escolher falar sobre cinema de forma séria demais, mas sem o aprofundamento que as pessoas sérias demais gostam. Além disso, dava capa para astros e quase nunca para os filmes (ou personagens). Hoje, astros não vendem longas, imagine revistas. Mas sempre há gênios para quebrar a cara. Nos EUA, só podemos ler sobre cinema em revistas/fanzines para fãs (Fangoria, Starlog), especializadas do mercado (Variety, Creative Screenwriting, American Cinematographer) ou no meio de outros assuntos pop (Entertaimment Weekly, a minha preferida).
Roger Ebert fala sobre indústria da celebridade. Os mesmos astros que não venderam a Premiere, vendem a US Weekly, People e mais uma dezena de revistas sensacionalistas com fotos toscas e informações desencontradas. São divertidas, claro que são. Mas o referencial está se perdendo. Elas não podem ditar todo o jornalismo cinematográfico. Em alguns anos, não teremos mais atores de verdade, mas estrelas fabricadas para vender o High School Musical da vez – sério, tem hora que não sei quem são aqueles dois se agarrando na capa de uma revista de fofoca e olhe que leio sobre cinema o tempo todo. Quando estou nos EUA ou vejo aquela idiotice do TMZ, entendo que aquilo é o público falando, mas não podemos trocar um pelo outro. Quando os jornais americanos começam a demitir jornalistas e críticos sérios para aumentar o espaço das fotos de Angelina Jolie saindo com Brad Pitt é hora de parar e pensar um pouco no que vai acontecer a médio prazo.
Sou meio pessimista em relação à mídia como conhecemos. Acho que tudo será diferente em menos de três anos. Mas isso é outro papo. A Inglaterra consegue lidar bem com essas mudanças. Suas revistas são sempre apelativas (veja nova a capa da Empire, abaixo) e bem humoradas, mas nunca perdem o foco do cinema, nunca. Sabem vender, mas sem entregar a alma como bônus. Mas leiam o que Ebert escreveu no seu momento Jerry Maguire no blog do Boston Globe. Como tou sério hoje...

4 comentários:
Tenho dois livros de Ebert. Curto sua escrita e sua paixão. Seu texto sobre a ordem da Associated Press tá muito bom.
OBS: Salem, você conferiu THE READER, do Stephen Daldry? Sei que deves está sob embargo, mas alguns críticos americanos já adiantaram muito do filme. Se vc viu, gostou?
Nisso de jornal querer virar revista de variedades, vai perder ainda mais identidade, e ainda mais leitores. E se levanta ainda mais a questão do "quem ainda lê jornal". Na verdade, nessa linha, alguém ainda lê? Vamos então nos tornar uma Caras e só publicar fotos, mas "com legenda", claro!
Sobre o texto do Ebert, fora a crítica em si, a parte mais interessante é a questão do papel do crítico. E nesse ponto... Estamos mal. A maioria das "críticas" que vejo é algo como "faça aí um resumo do filme".
Não vi The Reader. Semana que vem, talvez.
Olha, não sou partidário de críticas herméticas demais, longe disso. Acho arrogância jogar conhecimento apenas para dizer que tem conhecimento. Claro, há revistas que abrem espaço para isso, mas dificilmente são revistas que se importam com vendagem e público.
Tendo dito isso, me preocupa o lance da celebridade tomar todo o espaço reservado pra cinema. Como vc disse, logo teremos foto-legendas apenas. A discussão sobre a mudança de perfil de mídia é interessante. Ao mesmo tempo que estamos vendo o fim de uma, há o nascimento de outra. Como faremos pra sobreviver da outra? Longa questão...
Brilhante teu texto! Muito bom!
Também fico puto com tudo isso... Como trabalho em assessoria, preciso ler os principais jornais e revistas quase que diariamente, né... mas é uma bosta ver que tudo está ficando cada vez mais "CARAS"! Penso que o problema é que os veículos se ajustam ao perfil do consumidor moderno, né? Ou então, todos irão à falência. É essa merda que vende... Big Brother, Realities, vidas dos famosos... a arte caiu em desuso. Tá na literatura, na música, no cinema, na TV... em todos os lugares!
O que é arte hoje em dia? Eu sei. E vc tb sabe. Mas e a massa?
Abs!
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